Chove. Que fiz eu da vida?
de Fernando PessoaQuem eu pudera ter sido, que é dele?
Entre ódios pequenos de mim,
Estou de mim partido.
Fernando António Nogueira Pessoa (Lisboa, 13 de junho de 1888 — Lisboa, 30 de novembro de 1935) foi um poeta, filósofo, dramaturgo, ensaísta, tradutor, publicitário, astrólogo, inventor, empresário, correspondente comercial, crítico literário e comentarista político português.
Fernando Pessoa é o mais universal poeta português. Por ter sido educado na África do Sul, numa escola católica irlandesa, chegou a ter maior familiaridade com o idioma inglês do que com o português ao escrever os seus primeiros poemas nesse idioma. Das quatro obras que publicou em vida, três são na língua inglesa. Fernando Pessoa traduziu várias obras em inglês (e.g., de Shakespeare e Edgar Allan Poe) para o português, e obras portuguesas (nomeadamente de António Botto e Almada Negreiros) para o inglês.
Enquanto poeta, escreveu sobre diversas personalidades – heterônimos, como Ricardo Reis, Álvaro de Campos (que escreveu o famoso “Tabacaria”) e Alberto Caeiro –, sendo estes últimos objeto da maior parte dos estudos sobre a sua vida e obra.
Quem eu pudera ter sido, que é dele?
Entre ódios pequenos de mim,
Estou de mim partido.
As borboletas não têm cor nem movimento,
Assim como as flores não têm perfume nem cor.
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Breve momento em que um olhar
Sorriu ao certo para mim…
Entre o sono e sonho,
Entre mim e o que em mim
É o quem eu me suponho
Corre um rio sem fim.
Eu simplesmente sinto
Com a imaginação.
Não uso o coração.
Serei tal qual pareço em mim? Serei
Tal qual me julgo verdadeiramente?
O lago nada me diz,
Não sinto a brisa mexê-lo.
Nãosei se sou feliz
Nem se desejo sê-lo
Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só.
Que símbolo divino
Traz o dia já visto?
Na Cruz, que é o Destino,
A Rosa que é o Cristo.
Dorme, dorme. dorme,
Vaga em teu sorrir…