O Relógio
de João Cabral de Melo NetoAo redor da vida do homem
há certas caixas de vidro,
dentro das quais, como em jaula,
se ouve palpitar um bicho.
Ao redor da vida do homem
há certas caixas de vidro,
dentro das quais, como em jaula,
se ouve palpitar um bicho.
ao cair da tarde,
a chuva corre pelas montanhas,
e depois a noite é mais clara
Tem urgência,
medo de encanto quebrado,
é duro como osso duro.
Dois amantes que são?
Dois inimigos.
Amantes são meninos estragados
pelo mimo de amar.
As horas cantam cantigas
E eu vivo só de momentos,
Sou como as nuvens do céu…
Esta menina
tão pequenina
quer ser bailarina.
Meu pai pintou a casa toda
de alaranjado brilhante.
Seria essa estátua uma mera pedra,
um desfigurado mármore,
e nem já resplandecera mais
como pele de fera.
Eu ponho o amor no pilão
com cinza e grão de roxo
e soco.
No sonho em que se perdeu,
Banhou-se toda em luar…
Queria subir ao céu,
Queria descer ao mar…
Contra quem,
rosa,
adotaste esses espinhos?
Tu me moves, Senhor,
move-me o ver-te
cravado nessa cruz
e escarnecido.
E começo a acreditar
No mau feitiço da estrada:
Que se ela não começou
Também não foi acabada!