Dona Doida
de Adélia PradoQuando se pôde abrir as janelas,
as poças tremiam com os últimos pingos.
Adélia Luzia Prado de Freitas (Divinópolis, 13 de dezembro de 1935) é uma poetisa, professora, filósofa, romancista e contista, ligada ao Modernismo. Considerada uma das maiores poetisas do Brasil de todos os tempos.
Sua obra retrata o cotidiano com perplexidade e encanto, norteados pela fé cristã e permeados pelo aspecto lúdico, uma das características de seu estilo único. Em 1976, enviou o manuscrito de Bagagem para Affonso Romano de Sant’Anna, que assinava uma coluna de crítica literária no Jornal do Brasil. Admirado, acabou por repassar os manuscritos a Carlos Drummond de Andrade, que incentivou a publicação do livro pela Editora Imago em artigo do mesmo periódico.
Professora por formação, ela exerceu o magistério durante 24 anos, até que a carreira de escritora tornou-se a atividade central. Em termos de literatura brasileira, o surgimento da escritora representou a revalorização do feminino nas letras e da mulher como ser pensante, tendo-se em conta que Adélia incorpora os papéis de intelectual e de mãe, esposa e dona-de-casa.
Quando se pôde abrir as janelas,
as poças tremiam com os últimos pingos.
Janela, palavra linda.
Janela é o bater das asas da borboleta amarela.
Meu amor é maior,
mais belo sem ornamentos
do que um campo de flores.
Bem-aventurado o que pressentiu
quando a manhã começou:
não vai ser diferente da noite.
Tem urgência,
medo de encanto quebrado,
é duro como osso duro.
Meu pai pintou a casa toda
de alaranjado brilhante.
Eu ponho o amor no pilão
com cinza e grão de roxo
e soco.
Cargo muito pesado pra mulher,
Mas o que sinto escrevo.
Cumpro a sina.