Dialética
de Vinícius de MoraesÉ claro que te amo
E tenho tudo para ser feliz
É claro que te amo
E tenho tudo para ser feliz
Eu não tinha estas mãos sem força,
Tão paradas e frias e mortas;
Eu não tinha este coração
Que nem se mostra.
Na volta escura da escada.
O Anjo disse o meu nome.
Meu coração, coisa de aço,
Começa a achar um cansaço
Esta procura de espaço
Para o desenho da vida.
Não cantes. A praça cheia torna-se escura e subterrânea.
E meu nome se escuta a si mesmo, triste e falso.
Somente a Ingratidão – esta pantera –
Foi tua companheira inseparável!
Acostuma-te à lama que te espera!
Estes meus tristes pensamentos
Vieram de estrelas desfolhadas
Pela boca brusca dos ventos?
Esperarei pelo tempo
Com suas conquistas áridas.
Com uma palavra tão doce,
de maneira tão serena,
que até Deus pensou que fosse
felicidade – e não pena.
Busque Amor novas artes, novo engenho
Pera matar-me, e novas esquivanças,
Que não pode tirar-me as esperanças,
Que mal me tirará o que eu não tenho.
Mas porém se acontecesse
De São Pedro não abrisse
A porta do céu
E fosse de dizer qualquer tolice
Porque sempre a encolhida cobardia
De pedra serve ao livre pensamento.