A Rua dos Cataventos ( XXVIII )
de Mário QuintanaEsquecido que vou morrer enfim,
Eu me distraio a construir castelos…
Tão altos sempre…
Mário de Miranda Quintana (Alegrete, 30 de julho de 1906 — Porto Alegre, 5 de maio de 1994) foi um poeta, tradutor e jornalista brasileiro.
Mário Quintana fez as primeiras letras em sua cidade natal, mudando-se em 1919 para Porto Alegre, onde estudou no Colégio Militar, publicando ali suas primeiras produções literárias. Trabalhou para a Editora Globo e depois na farmácia paterna. Considerado o “poeta das coisas simples”, com um estilo marcado pela ironia, pela profundidade e pela perfeição técnica, ele trabalhou como jornalista quase toda a sua vida. Traduziu mais de cento e trinta obras da literatura universal, entre elas Em Busca do Tempo Perdido de Marcel Proust, Mrs Dalloway de Virginia Woolf, e Palavras e Sangue, de Giovanni Papini.
Em 1953, Quintana trabalhou no jornal Correio do Povo, como colunista da página de cultura, que saía aos sábados, e em 1977 saiu do jornal. Em 1940, ele lançou o seu primeiro livro de poesias, A Rua dos Cataventos, iniciando a sua carreira de poeta, escritor e autor infantil. Em 1966, foi publicada a sua Antologia Poética, com sessenta poemas, organizada por Rubem Braga e Paulo Mendes Campos, e lançada para comemorar seus sessenta anos de idade, sendo por esta razão o poeta saudado na Academia Brasileira de Letras por Augusto Meyer e Manuel Bandeira, que recita o poema Quintanares, de sua autoria, em homenagem ao colega gaúcho. No mesmo ano ganhou o Prêmio Fernando Chinaglia da União Brasileira de Escritores de melhor livro do ano. Em 1976, ao completar 70 anos, recebeu a medalha Negrinho do Pastoreio do governo do estado do Rio Grande do Sul. Em 1980 recebeu o prêmio Machado de Assis, da Academia Brasileira de Letras, pelo conjunto da obra.
Mário Quintana não se casou nem teve filhos. Solitário, viveu grande parte da vida em hotéis: de 1968 a 1980, residiu no Hotel Majestic, no centro histórico de Porto Alegre, de onde foi despejado quando o jornal Correio do Povo encerrou temporariamente suas atividades por problemas financeiros, e Quintana, sem salário, deixou de pagar o aluguel do quarto.
Na ocasião, o comentarista esportivo e ex-jogador da seleção Paulo Roberto Falcão cedeu a ele um dos quartos do Hotel Royal, de sua propriedade. A uma amiga que achou pequeno o quarto, Quintana disse: “Eu moro em mim mesmo. Não faz mal que o quarto seja pequeno. É bom, assim tenho menos lugares para perder as minhas coisas”.
Essa mesma amiga, contratada para registrar em fotografia os 80 anos de idade de Quintana, conseguiu um apartamento no Porto Alegre Residence, um apart-hotel no centro da cidade, onde o poeta viveu até sua morte. Ao conhecer o espaço, ele se encantou: “Tem até cozinha!”.[3] Em 1982, o prédio do Hotel Majestic, que fora considerado um marco arquitetônico de Porto Alegre, foi tombado. Em 1983, atendendo aos pedidos dos fãs gaúchos do poeta, o governo estadual do Rio Grande do Sul adquiriu o imóvel e transformou-o em centro cultural, batizado como Casa de Cultura Mário Quintana. O quarto do poeta foi reconstruído em uma de suas salas, sob orientação da sobrinha-neta Elena Quintana, que foi secretária dele em 1979 a 1994, quando ele faleceu. Segundo Mário, em entrevista dada a Edla Van Steen em 1979, seu nome foi registrado sem acento. Assim ele o usou por toda a vida. Faleceu em 1994 aos 87 anos em Porto Alegre. Encontra-se sepultado no Cemitério São Miguel e Almas em Porto Alegre. Em 2006, no centenário de seu nascimento, várias comemorações foram realizadas no estado do Rio Grande do Sul em sua homenagem.
Escola literária: Modernismo
Esquecido que vou morrer enfim,
Eu me distraio a construir castelos…
Tão altos sempre…
Seremos, na manhã,
duas máscaras calmas
e felizes
Manchas de sangue inda por lá ficaram,
Em cada sala em que me assassinaram…
(Naquele tempo, amigo, a tua vida era
Como uma pobre borboleta morta!)
A ciranda rodava no meio do mundo,
No meio do mundo a ciranda rodava.
A torre, sobre as velhas casas,
Fica cismando como é vasto o mundo!
Andam por tudo signos diversos
Impossíveis da gente decifrar.
Fiquei sozinho… Mas não creio, não,
Estejam nossas almas separadas!
Às vezes sinto aqui…
Eu nada mais desejo, nem a morte…
Delícia de ficar deitado ao fundo
Do barco!
Minha morte nasceu quando eu nasci.
Mas inda agora a estou sentindo aqui,
Grave e boa…
E tu não vieste, sob a paz lunar,
Beijar os seus entrefechados cílios
E as dolorosas bocas…
A tarde pobre fica,
horas inteiras,
a espiar pelas vidraças