Ano Novo
de Ferreira GullarIsso é coisa de homem
+Lá me esconde,
amor,
um mal,
que mata e não se vê
Vede que os humanos
Erros e cuidados
Nos são tão pesados
Como há dois mil anos.
Cansei-me de tentar o teu segredo
No teu olhar sem cor…
Que as tuas mãos saibam colher
aquilo que não foi…
Sabe Deus se te amei!
Sabem as noites
essa dor que alentei,
que tu nutrias!
E do ventre de além-mundo,
Sete crianças gritando
Na boca dos fuzilados…
– Qual a mais forte das armas,
A mais firme, a mais certeira?
E dizer-se que não tens nervos, ó nervosa,
Dizer que não tens alma!
Tão pequenina és tu, e, astuta e laboriosa…
Estás morto, estás velho, estás cansado!
+Tudo se apaga,
e se evapora,
e perde,
e esfuma…
Quantas e quantas almas endoidecem
Enquanto a boca ri alegremente!