x

Em sobressalto

de

As notícias me sobressaltam. Dia a dia
cada vez mais terríveis.
Brotam da terra pelos poros
entram pela janela em silvos ásperos
fazem pilha no chão em letras tortas
caem das nuvens em mortalhas.
E já são outras realidades apostas
ao retoque dos memorandos
às interpretações da ribalta
ao sortilégio da casa dos contos
ao ruminar dos bois — fuga e refúgio.
Em confronto são dúbias
precipitam-se acotovelam-se
em contramarcha se repelem.
Na deturpação do humano
anunciam com alvoroço
através de pinças de fogo
em cartazes de gelo
— o suicídio da multidão em nome de Deus
— o império do vício em nome da Arte
— o sequestro do juiz em prol da Justiça
— o arremesso de touros em via pública
para a alegria dos que se salvam.
 
Recuso-me a acreditar nas notícias
mas elas se impõem de cátedra
com implacável desfaçatez
talvez para convencer-nos
de que somos todos culpados.
Agem assim como tóxicos
impunemente sorvidos
nas delongas do tédio.
A busca de notícias é um mórbido
caminhar para a cruz
Sem embargo as procuro com empenho
na expectativa tantas vezes vã
de que à noite se mudem
na reparação no contraveneno
das notícias colhidas pela manhã.

Henriqueta Lisboa (1901-1985), poeta mineira
considerada pela crítica
um dos grandes nomes da lírica modernista,
dedicou-se à poesia, ensaios e traduções (...)

Fonte: jornal de poesia

postado por em 18-10-2008